quinta-feira, abril 28, 2011

Dissecando a Metamorfose - Por Gabriel Leles




Franz Kafka é considerado um dos maiores escritores do século XX. Considerado pessimista, sombrio, apenas captava um mundo trágico à sua volta. Considero Kafka o poeta do homem moderno, da beleza, do terrivel. Sua obra é um híbrido de loucura e lucidez. Kafka é o profeta da metamorfose do mundo. Em sua obra, o terror, o insólito, o inusitado, vão direto, sem ruído, ao drama univesal do pensamento. Na metamorfose, Gregor, transformado em inseto, é o próprio estado do SER: não pode abandonar a existência, porque existir é estar condenado a recair sempre na existência....

Uma das maiores alegrias desse trimestre: Indicamos aos jovens a leitura do livro A METAMORFOSE de Franz Kafka. Tive a oportunidade de ler relatos brilhantes. Entre eles, um se destacou pelo texto profundo e pela capacidade arguta de dialogar com  obra. Considero o relato de Gabriel Leles uma obra prima. Escrito um jovem paulistano, o texto abaixo comprova aquilo que muitos já disseram: não há idade para que um escritor se manifeste. Agradeço ao Gabriel ter encaminhado o texto e permitido que eu publicasse neste humuilde BLOG.


Dissecando a Metamorfose  - Por Gabriel Leles



“Numa manhã, ao despertar de sonhos inquietantes, Gregor Samsa deu por si na cama transformado num gigantesco inseto”. É incrível e ao mesmo tempo perturbador o inicio da genial obra de Franz Kafka, A Metamorfose.
Nos dias de hoje, onde o ceticismo predomina sobre a sociedade moderna, muitos irão certamente considerar a obra sem sentido e absurda, porém, uma obra de arte não deve ser olhada superficialmente, e sim, analisada em partes que compõe o todo.
Comecemos pela transformação do protagonista. Um inseto é realmente algo repugnante e asqueroso, mas, esta transformação realmente existe?
Se analisarmos o passado da personagem, veremos que Gregor Samsa é um jovem que possivelmente sofreu um amadurecimento social e emocional precoce, tendo que assumir as responsabilidades financeiras da família, sustentando os pais e a irmã.
Gregor trabalha como Caixeiro Viajante, tendo que viajar constantemente, o que leva a conclusão de que é um jovem solitário, que não consegue solidificar as relações sociais devido suas viagens frequentes.
A transformação em um inseto nos leva a crer que o estado emocional de Gregor não é dos melhores. As pressões familiares, a responsabilidade como filho primogênito e o fato de não ser uma pessoa realizada socialmente, e talvez até profissionalmente levam Gregor a um estado de depressão.
Não existe nenhum inseto, mas sim um ser humano que se sente como tal. E que não é apoiado por sua família, que o trata com a mesma repugnância que se trata um invasor. Talvez, o tratamento recebido seja uma espécie de amargura que atinge a família, ao ver-se obrigada a sustentar alguém, no caso Gregor, em vez de ser sustentada como era anteriormente.
No meio de seu processo depressivo, Gregor demonstra sinais de força de vontade, como o figurado ato de “andar pelas paredes”. Podemos notar que a família não consegue decifrar o que se passa internamente, fora de sua “casca externa”, o furacão psicológico em que a personagem se encontra.
A obra foi escrita na década de 10, quando o mundo passava por eventos como o naufrágio do navio Titanic, a Revolução Russa, a 1ª Guerra Mundial e o surto mundial de Gripe Espanhola. É também um período marcado por diversos movimentos filosóficos, religiosos e artísticos.
É claramente perceptível uma certa melancolia no enredo. Se observarmos o Pai de Gregor, nos deparamos com um homem pensativo, preso entre o passado e o turbilhão de acontecimentos recentes. Podemos dizer que o medo da mudança circunda a obra. Este fato pode se relacionar com o título da obra. “A Metamorfose” é uma mudança espontânea, que ocorre de repente, e é perceptível e incontrolável. As mutações na personagem são, na verdade, metáforas sobre o momento histórico que o mundo se encontrava.
Incompreendido, doente, e solitário; nessas condições completamente adversas a um ser humano, por mais forte e complexo que este pode ser, Gregor Samsa acaba por falecer. O final é carregado de sentimento de esperança e libertação. A morte da Metamorfose significa o fim de um período transitório, que modificava todas as vidas ao redor.
A obra é com certeza muito complexa e profunda. O estilo de escrita de Franz Kafka é tão sutil, que ler apenas uma vez não basta. Não é apenas uma história sobre um garoto que se transforma em um inseto, e sim uma grande metáfora sobre as transformações que ocorrem com todos.
A Franz Kafka, meu admirados e calorosos agradecimentos, por ter escrito algo tão primoroso.

Gabriel Leles é estudante matriculado na segunda Série do Ensino Médio do Colégio Argumento

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