quarta-feira, novembro 04, 2009

O FIM DE UMA UTOPIA.

Abaixo notícia anunciando o fim da União Soviética exibida no dia 25 de Dezembro de 1991. Os comentários imprudentes, levianos, anódinos e rasteiros de Pedro Bial, o apedeuta devem ser desconsiderados. É preferível o testemunho arguto do historiador Eric Hobsbawm:

Na última parte da década de 1980, quase no fim, um dramaturgo alemão-oriental escreveu uma peça chamada Os cavaleiros da Távola Redonda. Qual seria seu futuro?, perguntava Lancelote. ‘O povo lá fora já não quer mais saber do Santo Graal e da Távola Redonda [...] já não acreditam em nossa justiça e em nosso sonho [...] para o povo, os cavaleiros da Távola Redonda são um monte de tolos, idiotas e criminosos. ’ E ele próprio, ainda acredita no Graal? ‘Não sei’, diz Lancelote. ‘Não posso responder a essa pergunta. Não sei dizer nem sim e nem não...’ Não talvez nunca encontrem o Graal. Mas não terá razão o rei Arthur, ao dizer que o importante não é o Graal, e sim a sua busca? ‘Se desistirmos do Graal, desistiremos de nós mesmos’. Somente de nós? É possível à humanidade viver sem os ideais de liberdade e justiça, ou sem aqueles que dedicam suas vidas a eles? Ou talvez mesmo sem a memória daqueles que assim fizeram? HOBSBAWM, Eric J. Tempos interessantes: uma vida no século XX. São Paulo: Companhia das Letras, 2002. [pág. 173]

O que diferencia o homem dos demais seres vivos não é o produzir o construir, o guerrear, o jogar ou o viver em sociedade, mas ter a capacidade de pensar e sonhar. Ligar-se ao passado e ao futuro, ou seja, recordar e imaginar dá um sentido ao presente, torna o homem – e nisso reside sua especificidade essencial – um ser histórico, cultural. E é dessa competência que o ser humano engendra a utopia.
Já se disse que a História faz as utopias e as utopias fazem a História. Num certo sentido, cada sociedade humana é produto de suas angústias, suas fantasias e seus sonhos, projetados nas utopias que elabora. Para o sentimento de identidade coletiva, tão importante quanto viver uma mesma realidade concreta é sonhar os mesmos sonhos. Por isso talvez nenhum fenômeno humano expresse tão bem a dinâmica histórica quanto o incessante construir de utopias.
Uma sociedade sem utopias é triste, vazia e sem sentido. Nossa sociedade preenche o deserto utópico com oásis de mercadorias e desejos de consumo.
Negar a realidade em que se vive e projetar outra diferente e realizável.  Contra aqueles que, de forma impertinente, anunciam o fim das utopias respondemos com a afirmação do filósofo alemão Ernst Bloch: “ser humano significa ter uma utopia”. 
Assim, enquanto houver humanidade, haverá utopia. No ventre da utopia reinventa-se o mundo. A utopia assegura o espaço da liberdade. 
O mundo sem a URSS é possível e até mesmo preferível. Impossível é viver no mundo que não sonhe o impossível!

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