sábado, março 03, 2012

A Epistemologia Social de Marx: O Grande Diagnóstico do Século XX


“Proletários de todas as nações, uni-vos!” (Karl Marx)

“A dramática crise financeira que experimentamos nos últimos três anos é apenas um aspecto da trifurcada destrutibilidade do sistema de capital. Em primeiro lugar na esfera militar, com as intermináveis guerras do capital desde o começo do imperialismo monopolista nas décadas do século XIX”
(István Mészáros – filósofo socialista ainda vivo)

O filósofo alemão Karl Marx está encravado na história do pensamento social e econômico por ter feito uma espécie de diagnóstico da modernidade ao prever revoluções que dariam origem à redoma do contexto político e social do século XX. Ao separar capital de capitalismo e fabricar a vender a argamassa e os tijolos do sistema socialista, Marx inaugurou uma nova era tanto no mundo ocidental quanto no oriental. E se todas as nações que adotaram o socialismo mergulharam na decadência é porque, segundo o filósofo húngaro Stván Mészáros, mesmo sabendo se livrar do capitalismo, não o fizeram em relação ao capital...
 O diagnóstico marxista inicia-se, ao certo, com uma carta escrita a um célebre presidente estadunidense. Marx, em meados do século XIX, escreveu uma carta de elogio a Abraham Lincoln quando este foi eleito pela segunda vez. Nesta epístola Marx afirmou que, se a primeira eleição de Lincoln tinha como texto subliminar o combate ao escravismo, agora em sua reeleição ele de fato iria enterrar os escravistas de uma vez por todas. Mas o ponto central, que vai interessar a todo o pensamento social, político e econômico herdado de Marx, encontra-se muito além desse mero elogio. Marx afirma no corpo textual que os trabalhadores europeus estavam instintivamente percebendo, se é que já não tinham percebido, que para onde caminhassem os trabalhadores dos Estados Unidos da América caminharia todo o movimento operário europeu. Foi um tiro certeiro.
            De fato ele estava apostando nos princípios de sua teoria: o pólo mais desenvolvido, o mais esperançoso, onde as forças produtivas estão no ápice do desenvolvimento ou na iminência de se desenvolverem, carrega os outros pólos; e onde as forças produtivas já se desenvolveram bastante, onde as forças de produção as estão enterrando, o progresso atrai o não-progresso.
            Marx não estava considerando que os Estados Unidos da América seriam extremamente mais avançados econômica e tecnologicamente, embora o estivesse dizendo, porém afirmava, principalmente, que os Estados Unidos seriam o palco das transformações que moveriam todo o mundo.  E não há dúvida de que Marx acertou quando afirmou que toda nossa história atualmente, no século XXI, passa por Nova Iorque.
            Este princípio de que o poder mais desenvolvido do capitalismo move os pólos menos desenvolvidos, indicando que o filósofo, o cientista social, o geógrafo, o historiador e o economista devem olhar para o pólo mais desenvolvido do sistema capitalista era um dos princípios da sua Teoria da História, a qual concluiu observando o período moderno e as suas revoluções.
            Outro princípio básico de sua teoria era a respeito das questões ideológicas. Marx era da tradição platônica, em que os filósofos dividem o real do aparente. O real e o aparente ganham na época de Marx, a partir do filósofo inglês Francis Bacon, a ideia de real e ideológico, sendo que o ideológico é o aparente necessário: aquilo que se observa e que engana (por não ser o real), mas do qual não se pode escapar, salientando-se que ele faz parte da vida e, principalmente, da visão, tornando-a necessariamente deturpada. Bacon dizia que isso representaria os ídolos da tribo no início da modernidade, e depois o filósofo alemão Immanuel Kant vai chamar atenção para o mundo das idéias que definirão, de certo modo, alguma coisa que nos obriga a admitir que o que vemos não é de fato o real. Esses pensadores então começam a lapidar a partir de Platão um pensamento que desembocará em Marx e na dicotomia do real e do ideológico: estamos no mundo, fitamos a realidade e a vemos; porém, vemos também muitas coisas que são falsas consciências da realidade. Sendo assim, o papel de Marx é notar, estando nesse mundo e entendendo que ele mesmo está sob o efeito desta viseira ideológica e pode não enxergar a realidade além dos outros, mas pode apontar que outra sociedade tem o poder de nos tirar a viseira, outra sociedade que faça com que desapareçam essas condições ideológicas – nas palavras de Bacon, os ídolos da tribo. Marx, portanto, aposta que esses ídolos da tribo, essas visões ideológicas não estão somente na nossa consciência, mas também estão no âmbito social. Ou seja, e o que é mais surpreendente Marx passa a construir uma teoria do conhecimento social, uma epistemologia social, na qual os limites da razão são dados pela história, pelas questões que estamos vivendo. Essa é a grande força do pensamento marxista influenciado por Platão. Contudo, essas mesmas concepções tornam-se para o próprio Marx um calcanhar de Aquiles. Todavia, para que não se alargue tanto esse texto, discutirei num outro texto porque essa noção de epistemologia social se torna malogra ao próprio Marx.

                                                                           Eliakim Ferreira Oliveira
                                                                       São Paulo, 2 de Março de 2012

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